Aconteceu no Espírito Santo. Depois de dois meses sem pagar a taxa de condomínio, a moradora do oitavo andar de um prédio que tem apenas um apartamento por pavimento foi surpreendida ao ver que o elevador não mais parava no seu andar. O caso foi parar nos tribunais e, no mês passado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu em favor da condômina devedora, que ainda ganhou R$ 10 mil por danos morais. Na decisão, a ministra Nancy Andrighi alegou que o elevador é essencial para que a moradora exerça seu direito de propriedade.
De fato, a jurisprudência de casos assim diz que serviços essenciais como elevadores, água e luz não podem ser cortados. Mas, quanto aos serviços não essenciais, a questão é polêmica.
Para o advogado Armando Miceli Filho, por exemplo, o uso dos serviços não essenciais pode, sim, ser proibido aos inadimplentes. Afinal, acentua, a taxa serve para pagar pela manutenção das áreas comuns do prédio e quem não paga, não deve usufruir delas.
— O Código Civil prevê como punição apenas a multa, que é limitada a 2%. Mas os juízes vêm entendendo que não se pode cortar o que é essencial ao morador, como os elevadores ou a água. Agora, salão de festas, piscina, academia, não vejo o menor problema em proibir — afirma Miceli, citando casos em que juízes já deram ganho de causa a condomínios que proibiram o acesso a academia e piscina de prédios.
Leonardo Schneider, vice-presidente do Secovi-Rio e diretor da administradora Apsa, discorda. Para ele, nada deve ser negado ao condômino:
— Essa é uma questão muito delicada, que precisa ser mais discutida no Brasil. Mas, no momento, eu acho que a pessoa não pode ser proibida de usar as partes comuns, mesmo que esteja em débito, pois ela pode se sentir constrangida e levar o caso à Justiça.
Já o advogado Hamilton Quirino lembra que é preciso estar atento, antes de tudo, ao que diz a convenção:
— Nos empreendimentos com prestação de serviços, é comum a convenção prever a suspensão da linha telefônica pertencente ao condomínio e a supressão de serviços de mensageiro e camareira em casos de inadimplência. Algumas pessoas entendem que isso também se trata do exercício do direito de propriedade, mas eu discordo. Pois, se a questão está prevista na convenção, foi imposta pelo próprio condomínio, com a vontade de pelo menos dois terços dos condôminos.
Imóvel de devedor pode ir a leilão
Mas e quando não há previsão na convenção? Para Quirino, neste caso, não é possível cortar nem os chamados serviços não-essenciais. A solução seria entrar na Justiça para cobrar a dívida. Afinal, a dívida de taxa condominial pode levar o imóvel a leilão, mesmo que ele seja o único bem do devedor.
— No meio jurídico, dizemos que essa é uma ação de ganho provável, pois, quase sempre, o valor arrecadado no leilão será superior ao da dívida, então o condomínio não tem como perder. A não ser em casos em que a taxa não é paga há vários anos. Mas muitos condomínios demoram a tomar essa atitude porque não têm como arcar com as custas do processo — lembra Miceli.
Realmente, além de morosos, casos assim podem ter um custo alto para os condomínios, que devem pagar 2% do valor do processo (calculado multiplicando-se o valor da dívida por 12), além de custas judiciais que giram em torno dos R$ 500 e mais os honorários do advogado — que podem variar de um salário mínimo a um percentual do ganho de causa. Por isso, as próprias administradoras orientam os síndicos a negociar com o devedor e só entrar na Justiça em último caso, o que costuma acontecer entre 60 e 90 dias de atraso.
Mesmo sem CNPJ, cabe ir à Justiça
— No geral, não vale a pena cobrar na Justiça apenas uma ou duas taxas atrasadas. A não ser em condomínios de luxo que têm taxas muito altas — avalia Christiane Salles, gerente da administradora Protel, que tem como praxe mandar a primeira carta de cobrança após 20 dias de atraso e a segunda, depois de 35 dias. — Mas também sempre oriento que se faça um contato por telefone com o morador, para saber o que está acontecendo, e que se tente um acordo amigável para o pagamento.
E, vale lembrar ainda, mesmo os condomínios que não são legalmente constituídos (ou não têm o CNPJ) podem fazer a cobrança judicial. Basta, para isso, que tenham um síndico como seu representante legal.
Fonte: O Globo